O P. José Luís Carreño foi descrito pelo historiador José Thekkedath como “o salesiano mais amado do sul da Índia” no início do século XX. Em todos os lugares onde ele viveu – seja na Índia, nas Filipinas ou na Espanha – encontramos salesianos que guardam com carinho as lembranças dele. Estranhamente, porém, ainda não temos uma boa biografia desse grande salesiano. Esperamos remediar isso em breve. O P. Carreño foi um dos arquitetos da região do sul da Ásia e não podemos permitir-nos de esquecê-lo.
José Luís Carreño Etxeandía nasceu em Bilbau, Espanha, em 23 de outubro de 1905. Na véspera de sua ordenação, em 1932, ele se ofereceu como voluntário para as missões estrangeiras e foi enviado à Índia, chegando a Mumbai em 1933. Apenas um ano depois, quando a Província do Sul da Índia foi estabelecida, ele foi nomeado mestre de noviços em Tirupattur: tinha apenas 28 anos de idade. Com suas extraordinárias qualidades de mente e coração, ele rapidamente se tornou a alma da casa e deixou uma profunda impressão em seus noviços. “Fomos conquistados por seu coração paternal”, escreveu um de seus noviços, o Arcebispo Hubert D’Rosario. O padre José Vaz, outro noviço, sempre contava como Carreño percebeu que ele estava tremendo durante uma palestra. “Espere um momento, hombre”, disse o mestre de noviços e saiu. Pouco tempo depois, ele voltou com um macacão azul, que entregou a José. José notou que o moletom estava estranhamente quente. Então se lembrou de que o mestre de noviços usava algo azul por baixo da batina, que agora não estava mais lá. Carreño havia lhe dado o seu moletom.
Em 1942, quando o governo britânico na Índia deteve todos os estrangeiros que pertenciam a países em guerra com a Grã-Bretanha, Carreño, que pertencia a um país neutro, não foi incomodado. Em 1943, ele recebeu uma mensagem da Rádio Vaticano dizendo que assumiria o lugar de Eligio Cinato, o provincial da província do sul, que também estava detido. Ao mesmo tempo, o bispo Luís Mathias, de Madras, o convidou para ser seu vigário geral. Em 1945, ele foi oficialmente nomeado Inspetor, cargo que ocupou de 1945 a 1951. Um de seus primeiros atos foi consagrar a Inspetoria ao Sagrado Coração de Jesus. Muitos salesianos estavam convencidos de que o extraordinário crescimento da Província do Sul se devia a esse ato. Os centros salesianos dobraram sob a liderança do P. Carreño. Um de seus atos de maior alcance foi fundar um centro universitário na remota e pobre aldeia de Tirupattur. O Sacred Heart College (Centro Universitário Sagrado Coração) transformou todo o distrito.
Carreño também foi o principal responsável por “indianizar” o rosto dos salesianos na Índia, buscando imediatamente as vocações locais em vez de confiar apenas nos missionários. Foi uma política maravilhosamente providencial: quando a Índia independente decidiu não conceder vistos a novos missionários estrangeiros, os salesianos não foram pegos desprevenidos. “Se hoje há mais de dois mil salesianos na Índia, o crédito por esse crescimento vai para as políticas iniciadas pelo padre Carreño”, diz o P. Thekkedath em sua história dos salesianos na Índia.
O P. Carreño, como já dissemos, não era apenas inspetor, mas também vigário de Dom Mathias. Esses dois grandes homens que se admiravam mutuamente também tinham caráter muito diferente. O arcebispo era a favor de medidas disciplinares severas contra os Irmãos que erravam, enquanto o P. Carreño defendia procedimentos mais brandos. O visitante extraordinário, P. Fedrigotti, parece ter ficado do lado do arcebispo, chamando o P. Carreño de “um excelente religioso, um homem com um grande coração”, mas “um pouco poeta demais”. Alguns outros também afirmaram que o P. Carreño era um mau administrador, mas é interessante que um homem como o P. Aurélio Maschio tenha negado veementemente essa afirmação. O fato é que o P. Carreño foi um inovador e um visionário. Algumas de suas ideias – como trazer voluntários não salesianos para servir por alguns anos, por exemplo – foram mal vistas na época, mas são ativamente promovidas hoje.
Em 1952, depois de terminar seu mandato como Inspetor, o P. Carreño foi designado para Goa, onde permaneceu até 1960. “Goa foi amor à primeira vista”, escreveu ele em Warp in the Loom [Urdidura no Tear]. Goa, por sua vez, o acolheu em seu coração. Naqueles dias, os salesianos serviam como diretores espirituais e confessores do seminário diocesano e do clero, e o P. Carreño era até mesmo patrono da associação local de escritores “Konkani”. Os primeiros salesianos em Goa, como Thomas Fernandes, Elias Diaz e o falecido Rômulo Noronha, contaram com lágrimas nos olhos como o P. Carreño e outros iam ao hospital Goa Medical College [Hospital da Faculdade de Medicina de Goa], localizado nas vizinhanças, para doar sangue e comprar comida e outras coisas para os meninos.
Em 1962, o P. Carreño foi transferido novamente, dessa vez para as Filipinas, como Reitor e Diretor de Noviços em Canlubang. Em 1967, devido a diferenças entre os missionários da China e os da Índia, ele foi enviado de volta à Espanha. Mas, tanto nas Filipinas quanto na Índia, seus noviços não podem deixar de se lembrar desse homem extraordinário e da impressão que ele deixou neles. Na Espanha, ele fundou uma “Casa dos Missionários” e continuou seu apostolado como escritor. Ele deixou mais de 30 livros, além de hinos como o belo “Cor Iesu sacratissimum” [Sacratíssimo Coração de Jesus] e canções mais populares como “Kotagiri sulla montagna” [ Kotagiri sobre a montanha].
O Padre José Luís Carreño morreu em 1986 em Pamplona, Espanha, aos 81 anos de idade. Apesar dos altos e baixos de sua vida, esse grande amante do Sagrado Coração de Jesus pôde dizer no jubileu de ouro de sua ordenação sacerdotal: “Se há cinquenta anos meu lema como jovem sacerdote era ‘Cristo é tudo’, hoje, velho e dominado por seu amor, eu o escreveria em ouro maciço, porque na realidade CRISTO É TUDO”.
P. Ivo Coelho, sdb
Conselheiro para a Formação
P. José Luis Carreño Etxeandía. Um salesiano com o Coração de Jesus
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