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No sonho narrado por Dom Bosco na Crônica do Oratório, datado de 30 de maio, a devoção mariana converte-se num vívido juízo simbólico sobre os jovens do Oratório: um cortejo de jovens apresenta-se, cada qual com um dom, diante de um altar esplendidamente adornado para a Virgem. Um anjo, guardião da comunidade, acolhe ou rejeita as oferendas, desvendando-lhes o significado moral – flores perfumadas ou murchas, espinhos de desobediência, animais que personificam vícios graves como a impureza, o roubo e o escândalo. No âmago da visão, ecoa a mensagem educativa de Dom Bosco: humildade, obediência e castidade são os três pilares para se merecer a coroa de rosas de Maria.


            O Servo de Deus se consolava com a devoção a Maria Santíssima, honrada no mês de maio pela comunidade inteira de maneira especial. De suas pequenas falas à noite, a Crônica tem-nos conservado somente aquela do dia 30 do mês, que, entretanto, é de enorme preciosidade.

30 de maio

            Vi um grande altar dedicado a Maria, magnificamente decorado. Vi todos os jovens do Oratório, que em procissão se dirigiam para ele. Cantavam os louvores à Virgem Celeste, mas nem todos do mesmo modo, ainda que cantassem o mesmo hino. Muitos cantavam verdadeiramente bem e com precisão de ritmo, alguns mais forte outros mais suave. Outros cantavam com vozes péssimas e roucas. Uns destoavam. Havia os que avançavam silenciosos e saíam da fila. Uns bocejavam e pareciam enjoados; uns se empurravam e riam entre si. Todos também levavam seus presentes para oferecer a Maria. Todos tinham um ramalhete de flores, uns grandes e outros menores, diferentes um do outro. Quem tinha rosas, quem cravos, outro, violetas etc. Alguns levavam à Virgem presentes de fato estranhos: um a cabeça de um porco, outro um gato, quem um prato de sapos, quem um coelho, outro um cordeiro e outras ofertas.
            Um belo jovem estava na frente do altar, o qual, se observado com atenção se via que tinha asas nas costas. Talvez fosse o Anjo da Guarda do Oratório. À medida que os jovens chegavam, ele pegava as ofertas e as colocava sobre o altar.
            Os primeiros ofereceram magníficos buquês de flores; o anjo, sem nada dizer, os colocou no altar. Muitos outros trouxeram seus ramalhetes. O anjo os olhou, mandou desmanchar o ramalhete, fez tirar algumas flores que estavam estragadas, jogando-as fora e, refeito o ramalhete, o colocou sobre o altar. A outros que tinham flores bonitas, mas sem aroma, como seriam as dálias, as camélias etc., o anjo as fez jogar fora, pois Maria quer a realidade e não as aparências. E assim, refeito o ramalhete, o anjo o ofereceu à Virgem. Dentre as flores, muitas tinham espinhos, poucos ou muitos. Outras tinham pregos, e o anjo retirou estes e aqueles.
            Chegou, então, aquele trazia o porco, e o anjo lhe disse: – Tem coragem de oferecer a Maria este presente? Sabe o que significa o porco? Significa o vício feio da impureza. Maria que é toda pura não pode aceitar este dom. Retire-se, portanto, pois você não é digno de ficar na frente dela.
            Aproximaram-se os que tinham um gato. O anjo lhes disse: – Vocês também ousam trazer a Maria estes presentes? Sabem o que significa o gato? Simboliza o roubo, e vocês o oferecem à Virgem? São ladrões os que pegam dinheiro, coisas, livros dos companheiros; os que roubam comida do Oratório; que estragam as roupas por despeito, e desperdiçam o dinheiro dos pais porque não estudam. – E fez que estes também se retirassem à parte.
            Vieram os que tinham os pratos com sapos, e o anjo, indignado, disse: – Os sapos significam os vergonhosos pecados de escândalo, e vocês vêm para oferecê-los à Vigem? Voltem; retirem-se com os outros indignos. – Retiraram-se confusos.
            Alguns vinham com um punhal cravado no coração. Este punhal significava os sacrilégios. O anjo lhes disse: – Vocês não percebem que estão com a morte na alma? Que se estão com vida, é por misericórdia especial de Deus? De outra maneira estariam perdidos. Por favor, façam arrancar esse punhal! – E estes também foram rejeitados.
            Aos poucos todos os jovens se aproximaram. Há quem ofereceu cordeiros, coelhos, peixes, nozes, uva etc., etc. O anjo aceitou tudo e tudo colocou sobre o altar. E, após ter separados os jovens bons dos maus, mandou todos, dos quais foram aceitos os presentes a Maria, fazerem fila diante do altar. Os que tinham sido postos à parte, foram, para minha dor, muito mais numerosos do que acreditava.
            Apareceram, então, de um e de outro lado do altar, outros dois anjos. Seguravam duas riquíssimas cestas cheias de coroas feitas de rosas estupendas. Essas rosas não eram propriamente rosas da terra, mas sim, eram como que artificiais, símbolos da imortalidade.
            E o Anjo da Guarda pegou uma por uma daquelas coroas, e coroou todos os jovens que estavam enfileirados diante do altar. Entre as coroas havia umas maiores e outras menores, mas todas de admirável beleza. Notem que não estavam presentes somente os jovens atualmente da casa, mas também muitos outros que eu nunca vi. Pois bem, aconteceu uma coisa maravilhosa! Havia jovens de fisionomia tão feia que quase causavam nojo e repugnância. As estes couberam as coroas mais bonitas, significando que um exterior tão feio era suprido pelo presente, a virtude da castidade em grau eminente. Muitos se distinguiam por outras virtudes, como obediência, humildade, amor a Deus, e todos, de acordo com a grandeza destas virtudes, recebiam coroas correspondentes. E o anjo lhes disse:
            – Maria hoje quis que vocês fossem coroados com tão belas rosas. Recordem-se, contudo, de continuar de forma que não lhes sejam tiradas. Os meios para conservá-las são três. Pratiquem: 1º a humildade; 2º a obediência; 3º a castidade. Três virtudes que os farão sempre aceitos por Maria e, um dia, os tornarão dignos de receber uma coroa infinitamente mais linda do que estas.
            Então os jovens começaram a entoar diante do altar o Ave, Maris Stella (Ave, estrela do mar).
            E, tendo cantado a primeira estrofe, se movimentaram para retornar em procissão como tinham vindo, cantando o hino: Lodate Maria! Suas vozes eram tão fortes que eu fiquei espantado e maravilhado. Segui-os ainda por alguns instantes, voltando para ver os jovens separados pelo anjo. Porém não os vi mais.
            Meus caros! Sei quem foi coroado e quem o anjo expulsou. Di-lo-ei aos interessados, a fim de que procurem levar à Virgem presentes que ela se digne aceitar.
            Enquanto isso, algumas observações. – A primeira: Todos levavam flores à Virgem; havia flores de todos os tipos. Porém, observei que todos, quem mais quem menos, no meio das flores tinham espinhos. Pensei e pensei o que significariam aqueles espinhos, e descobri que realmente significavam a desobediência. Conservar dinheiro sem autorização e sem querer entregá-lo ao Prefeito [ecônomo]; solicitar permissão para ir a um lugar e depois ir num outro; ir para a aula quando os outros lá já se encontram há algum tempo; preparar saladas e outras comidas às escondidas; ir aos dormitórios dos outros quando é absolutamente proibido, qualquer que seja o motivo que possam ter; levantar-se tarde de manhã; deixar as práticas de piedade prescritas; conversar quando é tempo de fazer silêncio; comprar livros sem os mostrar; enviar sem licença cartas por meio de terceiros, para que não sejam vistas, e recebê-las usando o mesmo expediente; fazer contratos de compra e venda um com o outro. Eis o que significam os espinhos. Muitos de vocês perguntarão: é então pecado transgredir as regras da casa? Pensei seriamente nesta questão; respondo-lhes absolutamente, sim. Não lhes digo se grave ou leve: as circunstâncias dirão, mas é pecado. Alguém me dirá: mas na lei de Deus não está que devemos obedecer às regras da casa! Ouçam: está nos mandamentos: – honra pai e mãe! Sabem o que significam estas palavras pai e mãe? Referem-se também a quem lhes faz as vezes. Não está também escrito na sagrada escritura: oboedite praepositis vestris (Obedecei aos vossos dirigentes – Hb 13,17)? Se vocês têm de obedecer, é natural que eles têm de mandar. Eis a origem das regras de um Oratório, e eis se são obrigatórias ou não.
            Segunda observação: – Alguns tinham pregos no meio de suas flores, pregos que tinham servido para pregar o Senhor Jesus. E como? Sempre se começa pelas pequenas coisas e depois se chega às grandes. Aquele um queria ter dinheiro para satisfazer seus caprichos, portanto, para gastá-lo à sua maneira, não quis entregá-lo; depois começou a roubar livros de aula e terminou por furtar dinheiro e coisas dos colegas. Esse outro queria satisfazer a gula, e por isso garrafas etc., depois se permitiu licenças, em suma, caiu em pecado mortal. Eis como se acharam pregos naqueles ramalhetes; eis como o bom Jesus foi crucificado. O apóstolo diz que os pecados colocam de novo o Salvador na Cruz: Rursus crucifigentes filium Dei (Crucificam novamente o Filho e Deus – Hb 6,6).
            Terceira observação. – Muitos jovens tinham, entre as flores frescas e odoríferas, também flores murchas e podres, ou flores bonitas, mas sem aroma. Aquelas significavam as obras boas, mas feitas em pecado mortal, obras que não ajudam a aumentar seus merecimentos. As flores sem aroma são as obras realizadas por objetivos humanos, por ambição, somente para agradar aos professores e aos superiores. Então o anjo os censurava por ousarem levar semelhantes ofertas a Maria, e os mandava de volta para refazer o ramalhete. Eles se retiravam, o desfaziam, tiravam as flores estragadas e, depois, ajeitadas de novo as flores, as amarravam como antes, e as levavam ao anjo que, então, as aceitava e as colocava na mesa. Estes ao voltar não seguiam nenhuma ordem de fila, mas mal estavam prontos, quem antes, quem depois, cada um trazia de volta seu ramalhete e ia se colocar com aqueles que deviam receber a coroa.
            Neste sonho eu vi tudo o que foi e o que será de meus jovens. Para muitos já o disse. Aos outros, di-lo-ei. Por enquanto, procurem que esta Virgem Celeste sempre receba de vocês presentes que nunca tenham de ser recusados.
(MBp VIII, 157-161)


Foto de abertura: Carlo Acutis durante uma visita ao Santuário Mariano de Fátima.